Brasil – O projeto de lei que equipara o aborto após a 22ª semana de gestação ao crime de homicídio foi apresentado pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), membro da bancada evangélica. A proposta prevê penas mais severas para mulheres que realizarem o procedimento, atualmente protegido por lei, em comparação às penas para homens que cometerem estupro.
- Publicidades -
Se aprovado, o aborto seria tratado como homicídio simples, conforme o artigo 121 do Código Penal, com penas variando entre 6 e 20 anos de prisão. Já o estupro, previsto no artigo 213 do Código Penal, tem pena mínima de 6 anos para vítimas adultas, podendo chegar a 10 anos. Para vítimas menores de idade, a pena mínima é de 8 anos e a máxima de 12 anos. No caso de estupro de vulnerável (Art. 217-A), a pena mínima é de 8 anos e a máxima pode chegar a 15 anos, podendo atingir 20 anos se resultar em lesão corporal grave.
Discrepância nas penas
Em um cenário hipotético, uma mulher adulta vítima de estupro que interrompa a gravidez após a 22ª semana pode ser condenada a 20 anos de prisão, enquanto seu estuprador pode pegar entre 6 e 10 anos. A advogada e especialista em gênero Maíra Recchia criticou duramente o projeto, destacando que a legislação atual não pune o aborto em casos de estupro e não impõe restrição de tempo para o procedimento. Ela ressalta que o projeto criminaliza até os casos em que o aborto é necessário para proteger a vida da mãe.
Ao ser questionado sobre a discrepância nas penas, o autor do projeto afirmou que a aplicação da lei “ficará ao cargo do juiz” e que tentaria negociar ajustes.
Reação do governo
O projeto de lei gerou forte reação no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. O ministro Silvio Almeida classificou a medida como uma “imoralidade e inversão dos valores civilizatórios mais básicos”. Ele destacou que a proposta trata a mulher estuprada e o estuprador como se tivessem o mesmo valor perante a lei, ou pior, considera o estuprador menos criminoso.
Almeida afirmou que o projeto é inconstitucional por violar o princípio da dignidade humana e submeter mulheres violentadas a um tratamento discriminatório. Para ele, a lei materializa o ódio contra mulheres e promove a discriminação. Como pai, filho, cidadão, jurista e ministro, ele declarou que jamais poderia se conformar com uma proposta tão nefasta e violenta.
Entenda o projeto
O texto modifica o Código Penal para aplicar penas de homicídio simples em casos de aborto de fetos com mais de 22 semanas, seja a gestante quem provoca o aborto em si mesma ou consente que outra pessoa o faça. A pena passa de 1 a 3 anos para 6 a 20 anos. Quem realizar o procedimento com consentimento da gestante terá a pena aumentada de 1 a 4 anos para 6 a 20 anos, mesma pena para quem realizar o aborto sem consentimento, atualmente fixada entre 3 a 10 anos.
A proposta restringe a prática do aborto em casos de gestação resultante de estupro, permitindo o procedimento apenas até a 22ª semana de gestação. Após esse período, mesmo em caso de estupro, a prática será criminalizada.
O projeto é apoiado por 32 deputados, incluindo o segundo vice-presidente da Câmara, Sóstenes Cavalcante, e o presidente da bancada evangélica, Eli Borges (PL-TO).
Bancada quer ‘testar’ Lula
Sóstenes Cavalcante defendeu sua proposta após a repercussão, prevendo que o projeto será aprovado com mais de 300 votos no plenário da Câmara, que conta com 513 deputados. Ele afirmou que a bancada evangélica vê o projeto como um “teste” para o presidente Lula, desafiando-o a vetar a proposta, já que Lula declarou ser contra o aborto durante a campanha.
A bancada evangélica acredita que o PT liberará seus deputados para evitar desgastes em ano eleitoral.