Os problemas da romantização da neurodiversidade
O debate sobre inclusão tem trazido inúmeros benefícios e visibilidade a pessoas que precisam de atenção, tanto das autoridades governamentais — para a promoção de políticas públicas — quanto da sociedade em geral, que muitas vezes tende, à primeira vista, a rejeitar quem é diferente. Contudo, como acontece com tudo o que se torna mainstream, a pauta da neurodiversidade também acabou se tornando um tipo de fetiche para curiosos e “entusiastas” do que é considerado exótico.
Num mundo que clama por originalidade, muitos acabam encontrando na neurodiversidade um elemento para se destacar diante da maioria. Essa situação, infelizmente, prejudica quem realmente enfrenta, dia após dia, os desafios dos transtornos neurodivergentes — lidando com os prejuízos e estereótipos associados a condições atípicas de comportamento. Assim, vemos surgir uma romantização de transtornos que, na realidade, deveriam ser tratados com seriedade e cuidado, adaptando o entendimento do outro, e não sendo reduzidos a meros traços de personalidade: “Foi mal, gente! É que eu tenho TDAH!”.
A verdade é que aqueles que convivem com a neurodiversidade como uma condição real e constante sabem o quão desafiador é ser mãe ou pai de uma criança autista, ou conviver com alguém com TDAH, Síndrome de Tourette, entre outras condições neurológicas que exigem acompanhamento específico e um enorme investimento de tempo, energia e amor.
Enquanto pessoa autista, posso afirmar com propriedade: o romantismo em torno da nossa condição termina na segunda página. Depois disso, o que resta é terapia, medicação, autorregulação, frustração e a necessidade de muita compreensão por parte de quem convive conosco. O que é simples e rotineiro para muitos pode ser extremamente desgastante e doloroso para crianças e adultos autistas. É urgente que aprendamos a enxergar o outro como um ser humano complexo — e não reduzirmos condições neurológicas a desculpas comportamentais.
Não estou aqui para impor regras ou censurar quem, talvez por ignorância, trivialize essas questões. Apenas peço: informem-se. Se você acha que pode ter alguma condição atípica, procure um profissional. Diagnóstico e tratamento corretos fazem toda a diferença. O tempo passa e, com ele, muitas oportunidades se perdem.
Assim, vamos combinar: uma pessoa desligada e antissocial nem sempre é autista. Uma pessoa distraída ou esquecida nem sempre tem TDAH. Uma pessoa desbocada e mal-educada nem sempre tem Tourette.
Sejamos sensatos, tá bem?