Artigo – Para analisarmos um tema tão delicado, precisamos primeiramente definir os termos e conceitos, para não sermos levados pelo discurso da maioria, sendo meros repetidores de argumentos que não paramos, de fato, para pensar sobre. O caso recente de um homem em Campinas que foi vítima de estupro na última semana trouxe, de volta à cena, essa discussão. O termo “Cultura” pode ser definido como: um conjunto de tradições, conhecimentos, práticas que caracterizam a identidade de um povo. Desta forma, podemos concluir que a cultura tem a ver com aquilo que uma sociedade específica enxerga como sua característica, como se ela pudesse ser definida por aspectos específicos, tais como: músicas, comidas típicas, artesanato, idioma etc.
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Pensando nesse contexto, será que faz algum sentido atribuir, mesmo que de forma metafórica o conceito de cultura a um crime tão hediondo e desprezível contra a integridade humana? Será que de fato poderíamos dizer que toda uma sociedade seria conivente com abuso (físico e mental) que viola o corpo e os direitos do outro? Possivelmente existam comunidades e pequenos grupos em lugares menos assistidos que possam conviver com realidades assim, não porque acham normal, mas porque são pessoas carentes que precisam lidar também com a falta de recursos básicos para sobrevivência, como comida e água potável.
Não é ruim propor discussões sobre este crime, muito pelo contrário, é necessário. Entretanto, chegar ao ponto de classificar um país como o Brasil como tendo uma “cultura do estupro” é algo no mínimo problemático, não à toa desde as primeiras vezes que o termo foi alcunhado, em meados da década de 70, muitas discussões tem sido levantadas sobre o tema e o termo (mais sobre o termo em si, diga-se de passagem). É importante reconhecer que a cultura não é estática e homogênea. Ela é dinâmica e pode variar amplamente dentro de um país, região ou comunidade. Enquanto certos comportamentos podem ser tolerados ou até mesmo encorajados em algumas culturas, isso não significa que todos os membros dessa sociedade concordam ou praticam esses comportamento.
A ideia de uma “cultura do estupro” levanta questões delicadas sobre como os valores sociais e as normas culturais podem influenciar atitudes em relação ao consentimento, à violência sexual e à igualdade de gênero. No entanto, rotular um país inteiro, como o Brasil, com uma cultura do estupro é generalizar e simplificar demais uma questão complexa.
É crucial analisar as causas subjacentes da violência sexual, como desigualdade de gênero, falta de educação sexual adequada, impunidade para os agressores e a perpetuação de estereótipos prejudiciais. Focar apenas na ideia de uma cultura do estupro pode obscurecer essas questões e dificultar a implementação de soluções eficazes. Portanto, é necessário promover discussões informadas e cuidadosas sobre o estupro e suas raízes sociais, sem cair em generalizações simplistas que possam prejudicar a compreensão do problema e a busca por soluções efetivas.
Em vez de usar termos como “cultura do estupro”, que podem ser generalizantes, é mais preciso falar sobre problemas específicos, como “altos índices de violência sexual” ou “normas sociais que toleram a violência contra as mulheres”. Esses termos reconhecem a complexidade do problema e permitem uma discussão mais informada e direcionada para soluções.
Wesley Santos
Professor e Pesquisador