Mais um julgamento foi cancelado em Araguaína, no norte do Tocantins, após um promotor de justiça se recusar a utilizar máscara de proteção durante a sessão do tribunal do júri. O impasse entre o Ministério Público e a Justiça vem acontecendo desde a semana passada e pelo menos cinco julgamentos de pessoas acusadas de assassinato ou tentativa de assassinato foram cancelados.
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Desta vez o julgamento cancelado foi o de Marcos Vinícius Barbosa de Brito, acusado de homicídio duplamente qualificado contra Diogo Noleto Sobral, em abril deste ano. Conforme decisão publicada nesta quarta-feira (16), o juiz Francisco Vieira Filho, o promotor do caso tem causado empecilho ao funcionamento da Justiça.
“[…] chama-nos a atenção especificamente o fato de o promotor de justiça ser o causador desse empecilho ao funcionamento escorreito e seguro da máquina judiciária, logo ele que reafirma constantemente em plenário ter atribuição de assegurar a saúde e os demais direitos da coletividade”, afirma o juiz.
Segundo o Ministério Público, em momento algum o promotor de Justiça se recusou a fazer o uso da máscara nas sessões do Júri, mas apenas requereu ao juiz que durante a sustentação oral, que tem duração pelo menos de 1h30, utilizasse apenas o protetor facial de acrílico. (Veja nota no fim desta reportagem)
Na decisão, o juiz afirma que o item acrílico não oferece a mesma proteção e que a obrigatoriedade de máscara durante os julgamento é para obedecer normas sanitárias que têm sido estabelecidas para combater a pandemia de coronavírus, em decretos federais, estaduais, municipal e portaria do próprio judiciário.
“Diferentemente do que sustentado na manifestação no evento 198, não se trata de estabelecer uma pretensa relação de subordinação entre o Ministério Público e o Poder Judiciário, mas apenas de fazer valer normas sanitárias emitidas dentro de uma conformação democrática, e que, por óbvio, devem alcançar todos, independente do cargo ou status social”, diz a decisão.
O juiz afirma que a obrigatoriedade ao uso do item não viola os direitos de fala das partes ou prejudica a defesa do réu. Além disso, disse que nenhum dos outros servidores que participam dos julgamentos se recusaram a utilizar a máscara e lembrou o caso do desembargador que humilhou um guarda em Santos (SP) após se recusar a usar o item e via pública.
“Não posso deixar de consignar que este episódio faz ressurgir em minha mente o caso específico de uma autoridade judicial que se recusou publicamente a usar máscara durante sua caminhada na orla santista, como se seu interesse e pensamento pessoais acerca da obrigatoriedade do uso de máscara estivessem acima da ciência, normas em vigência e saúde da população”, afirma o juiz.
Com o cancelamento do tribunal do júri o réu ainda não tem uma nova data para ser julgado. O juiz Francisco Vieira Filho afirmou que a prisão preventiva dele nesse processo se torna ilegal e mandou soltá-lo. Porém, Marcos Vinícius Barbosa de Brito continuará preso porque responde a outros três processos em que teve a prisão determinada.
O que diz o MPE
O Ministério Público esclarece que em momento algum o promotor de Justiça se recusou a fazer o uso da máscara nas sessões do Júri. Apenas requereu ao juiz que, excepcionalmente, durante a sustentação oral, que tem duração pelo menos de 1h30, utilizasse apenas o protetor facial de acrílico, mantendo a distância segura dos presentes, a fim de preservar a plena defesa da sociedade garantida pela Constituição.
“As sessões do Tribunal do Júri são dotadas de complexidade. O Ministério Público entende que o uso da máscara, durante os debates, pode prejudicar o resultado dos julgamentos, uma vez que a máscara impede a qualidade e clareza na oratória, comprometendo o entendimento dos jurados quanto aos fatos expostos”, diz nota do MPE.
Ainda segundo o MPE, é importante ressaltar que o Tribunal de Justiça não tem um plano de biossegurança para as sessões do tribunal do júri, que tem suas peculiaridades. A nota afirma ainda que Araguaína é o epicentro da pandemia e o Ministério Público requereu o adiamento da temporada de júris na Comarca, entendendo não haver prejuízo algum para os processos, assim como aconteceu nas demais Comarcas do Estado.
“Diante do fato do juiz não atender o pedido para dispensar o uso da máscara, apenas durante os debates, os próximos julgamentos também não devem acontecer. O Ministério Público vai recorrer em todos os processos”, diz nota.
Impasse
Na última terça-feira (15), outros quatro julgamentos foram cancelados após a promotoria de Araguaína. Quando informou que não pretendia utilizar a máscara durante as audiências, o promotor alegou à Justiça que estava obedecendo a uma recomendação da Corregedoria-Geral do Ministério Público.
Segundo ele, não havia como realizar o trabalho de “maneira minimamente eficiente com a boca do orador obstruída”.