O indígena Lucas Gomes de Souza Apinagé, aos 19 anos, realiza o sonho de infância de cursar Medicina. O jovem, que vem da aldeia Botica, pertencente ao município de Maurilândia, no interior do Tocantins, é o primeiro indígena Apinagé do Estado a ser aprovado no tão disputado curso.
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Lucas ingressará na Universidade Estadual do Tocantins (Unitins), no primeiro semestre deste ano. Com grandes expectativas, o jovem contou ao Jornal Sou de Palmas que o desejo e sonho pela profissão surgiram ao perceber as dificuldades que seu povo sofria com a falta de políticas públicas de atenção à saúde indígena.
“O sonho de fazer medicina surgiu quando comecei a entender e perceber os problemas de acesso e atendimento médico as comunidades indígenas. Esse desejo de poder ajudar o meu povo cresceu em mim”, explicou.
O futuro estudante de medicina citou a crise de saúde vivenciada pelos povos Yanomamis como exemplo. “Hoje, com a situação em que se encontram os povos Yanomamis, minha vontade é de poder ajudar e contribuir, de certa forma, com o despertar do sentimento entre os jovens indígenas de outras aldeias do nosso estado a persistirem e lutarem de formas a ajudar seu povo”, complementou.
Alfabetizado na Aldeia, Lucas relata que sua dedicação e motivação para os estudos tiveram início após ser transferido para uma Escola na cidade.
“Terminei o ensino médio em 2021. Fui alfabetizado na aldeia e reprovei no ano em que fui estudar na cidade, depois disso senti uma motivação muito grande para me dedicar aos estudos, desde então me dediquei muito à escola”, relatou.
Pandemia
Em entrevista ao Jornal, o jovem também lembrou que enfrentou dificuldades durante a pandemia da Covid-19 com o ensino remoto.
“A pandemia afetou meu estudo, durante toda a minha vida, todo o meu ensino foi através do contato presencial com os professores. A adaptação para o ensino à distância me prejudicou bastante. Minha solução foi estudar por tópicos, um pouquinho dia após dia, mas foi muito difícil”, apontou.
Após terminar o ensino médio, visando complementar os estudos, o jovem entrou em um cursinho pré-vestibular. Ele fez o vestibular da Universidade Estadual do Tocantins (Unitins), em Augustinópolis, local em que foi aprovado.
Família
Em um relato emocionante, o indígena destacou sobre o importante papel de suporte que sua família e namorada tiveram como motivadores e apoiadores.
“Toda a minha família sempre me apoiaram nesse sonho, e ouso dizer que devo parte da minha conquista também a minha namorada, porque ela sempre esteve ao meu lado me incentivando, me motivando. Ela me contagiou a seguir e lutar para seguir esse caminho”, frisou.
Questionada sobre como se sentiu após saber da aprovação do namorado, a estudante de Medicina, Dominique Peixoto Maranhão de Sousa Sabóia declarou estar orgulhosa e grata pela conquista do jovem.
“Me sinto muito feliz, orgulhosa e grata por ele ter conseguido conquistar o seu maior sonho, Lucas passou por situações de bullying e preconceito, mas se concentrou em seus estudos e foi atrás de realizar o que sempre sonhou. Me sinto muito orgulhosa do meu namorado, vejo a importância das lutas indígenas e espero que ele possa influenciar ainda mais indígenas a seguirem seus sonhos. Também me sinto esperançosa com a aprovação do Lucas, meu desejo é de que ele se torne um grande médico e continue lutando pelo seu povo”, declarou.
Para Lucas, a notícia de aprovação foi um momento de êxtase, mas que nada se comparou ao sentimento de ver sua família orgulhosa. “Fiquei um tempo sem acreditar que esse dia tinha chegado [da aprovação], que eu ia realizar meu sonho e que estava dando orgulho para toda a minha família. Ver meu pai, minha mãe e toda minha família orgulhosos de mim não tem preço, é tudo por eles!”, disse.
Sua ancestralidade, segundo ele, também foi e é um passo importante para conseguir se manter focado nos estudos. Durante a entrevista, Lucas relatou quais são seus planos para o futuro. “Meus planos são de voltar para a minha aldeia indígena e ajudá-los, desejo me tornar um médico humano, capaz de atender a todos com equidade e respeito”, falou.
Comemoração
Em comemoração, os indígenas da Aldeia Botica preparam, nesse último domingo (29), uma cerimônia de agradecimento a grandes conquistas. Sua irmã, Ana Caroline Amnhi Apinagé, demonstrou estar feliz pelo sucesso do caçula e esperançosa quanto ao futuro da saúde indígena.
“Me sinto muito feliz, foi muito gratificante para toda a família e claro, para toda a comunidade indígena, é uma conquista histórica não só para ele, mas também para o povo Apinajé”, afirmou.
Aldeia Botica
Localizada ao extremo norte do Estado do Tocantins, a Aldeia Botica conta atualmente com aproximadamente 70 indígenas. Caracterizados por sua forte relação com a natureza, a atividade agrícola do local é marcada pelo respeito e valorização do meio ambiente. Os moradores possuem uma roça comunitária, com plantações de mandioca, batata, arroz, feijão, milho e abóbora, que servem como agricultura de subsistência.