Com a aprovação da Câmara dos Deputados a respeito do texto-base do Projeto de Lei 490/07, que trata do marco temporal das terras indígenas nesta última terça-feira (30), diversos povos indígenas tocantinenses podem perder direito de seus territórios. O Jornal Sou de Palmas entrou em contato com a Secretária dos Povos Originários e Tradicionais do Tocantins, Narúbia Werreira para entender melhor os impactos da nova PL no Estado, caso aprovada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e Senado Federal nos próximos dias.
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O projeto tem sido duramente criticado por ambientalistas e indígenas, e segundo líderes como Sonia Guajajara, Ministra dos Povos Indígenas do Brasil, a proposta não é constitucional, pois viola o direito territorial dos povos indígenas do Brasil: “Sabemos que os conflitos entre indígenas e proprietários rurais existem e que, inclusive, aumentaram consideravelmente nos últimos anos, mas a razão para que estes conflitos não cessem é apenas uma: a morosidade do Estado brasileiro em demarcar os territórios indígenas. Não haverá segurança jurídica no campo sem que todas as terras indígenas sejam demarcadas”, afirmou a ministra Sônia, durante a audiência da CCJ
Relação com o território
A Ministra afirmou que a PL 490 é um “genocídio legislado” alegando que o direito não se baseia em leis civis tradicionais, mas sim em direitos originários. Isso significa que as terras dos indígenas não se encaixam nessa tipologia de direitos reais e possessórios, uma vez que seus vínculos com suas terras são baseadso em sua ancestralidade, cultura e relação espiritual com o ambiente:
Sabemos que, infelizmente, para muitas pessoas deste país ainda é muito difícil compreender o conceito da dívida histórica [que o país tem com os indígenas]. Até mesmo para alguns parlamentares desta Casa, as políticas públicas afirmativas que visam à reparação desta dívida histórica nem deveria existir”,
Pontuou a Ministra Sônia Guajajara.
Tocantins
No Tocantins, a Secretaria Estadual dos Povos Originários e Tradicionais está realizando um levantamento para saber com precisão, quais povos e quantos indígenas serão diretamente afetados com o PL. Os povos Xerente, Krahô-Kanela e Pankararu tiveram suas demarcações após a constituição de 1988 e até o momento, sabe-se que cerca de 4 a 6 mil indígenas poderão perder o direito dos seus territórios.
Segundo a Secretária Estadual dos Povos Originários e Tradicionais do Tocantins, Narubia Werreira Karajá, “é um combo desastroso para os povos indígenas. Uma das leis mais violentas, juridicamente falando, para a população indígena do Tocantins e do Brasil.”
Segundo Narubia, indígenas tocantinenses tem se manifestado contra a PL desde seu surgimento na Câmara dos Deputados, por parte da Frente Parlamentar da Agropecuária: “O movimento indígena do Tocantins vem há muito tempo contestando e participando das mobilizações nacionais. Por exemplo, o levante pela terra, que aconteceu em Brasília, todos os ATLs (Acampamento terra Livre)… Os povos indígenas do Tocantins vão a Brasília e fazem parte dessa mobilização geral contra essa PL e já tem anos de luta.”
6 votos a favor no Tocantins
Os deputados federais Alexandre Guimarães (Republicanos), Antônio Andrade (Republicanos), Carlos Gaguim (UB), Eli Borges (PL), Filipe Martins (PL) e Vicentinho Júnior (PP); votaram a favor do Marco temporal e segundo a secretária, não houve consulta com líderes indígenas, apontando um sinal de desconsideração com a etnia, por parte dos parlamentares:
“Eles fizeram de forma independente e não houve consulta também com os líderes indígenas, conversas, para que os líderes se posicionassem em relação a isso. Muitos deputados vão a territórios indígenas, pedem voto e seria muito importante ouvi-los num momento como esse né, que atinge diretamente o interesse dos povos originários.”
Ministério e secretaria
Assim como Sonia Guajajara, Narubia ressaltou a diferença das visões a respeito dos territórios e comentou a fala da Ministra: “Nós costumamos dizer que nossos corpos são territórios. Toda a nossa vida e a nossa cosmovisão está integrada com nossos territórios. Então, quando você tira territórios, você está tirando a vida desses povos“, e completou:
É um dos atos mais tristes deste a redemocratização é ter os territórios atingidos, pois vai descaracterizar completamente […] Para nós a natureza está dentro de nós, nós somos dessa terra e essa terra é nossa. É uma anomalia jurídica de ganância pelos territórios dos povos originários”
Ao levantar questões de interesse financeiro, Narubia apontou relações entre a PL 490 e a colonização do país: “Você vê toda uma lógica de colonização, como se nós povos indígenas quiséssemos viver esse modelo, e esse sistema que não faz parte da nossa cultura tradicional. Isso me lembra daquela frase que alguns brasileiros falam, que é extremamente preocupante: Minha vó foi pega no laço”, finalizou a secretária.