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50 anos de impunidade: Estupro de menina em 1973 virou marco na luta contra o abuso infantil; relembre o caso da criança que foi raptada, drogada, estuprada e morta no ES
O caso do desaparecimento e morte da menina de oito anos, Araceli Cabrera Crespo, em maio de 1973, intriga pela grande quantidade de fatos desencontrados até hoje, 50 anos depois do crime. Polícia, suspeitos e familiares se depararam com diversas versões ao longo desses anos, e o crime permanece sem solução. O processo, depois do julgamento e absolvição dos acusados, foi arquivado pela Justiça.
Araceli foi raptada, drogada, estuprada, morta e carbonizada no Espírito Santo. O corpo foi deixado desfigurado e em avançado estado de decomposição próximo a uma mata, em Vitória, dias depois de desaparecer.
Depois de alguns anos, o dia do desaparecimento de Araceli passou a servir de marco para alertar a sociedade sobre a violência contra as crianças. O 18 de maio foi instituído como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, desde o ano 2000.
O desaparecimento
O dia 18 de maio de 1973, uma sexta-feira, começou como um dia qualquer na família Cabrera Crespo. Araceli saiu de casa, no bairro de Fátima, na Serra, e seguiu para a Escola São Pedro, na Praia do Suá, em Vitória.
Por conta do horário do ônibus que a levaria de volta para casa, a mãe, Lola Cabrera Crespo, pediu para que Araceli saísse da escola mais cedo.
Ao sair da escola, ela foi vista por um adolescente em um bar entre o cruzamento das avenidas Ferreira Coelho e César Hilal, em Vitória, que fica a poucos minutos da escola onde a menina estudava.
Essa testemunha disse à polícia, na época, que a menina não tinha entrado no coletivo e ficou brincando com um gato no estabelecimento. Depois disso, Araceli não foi mais vista. Quando a noite chegou, o pai, Gabriel Sanchez Crespo, iniciou as buscas.
Corpo encontrado
Dias após o desaparecimento, em 24 de maio, o corpo de uma criança foi encontrado desfigurado e em avançado estado de decomposição em uma mata atrás do Hospital Infantil, em Vitória.
Inicialmente, o pai de Araceli reconheceu o corpo como sendo da menina. No dia seguinte, ele negou, afirmando que o corpo não era o da filha desaparecida. Meses depois, após exames, foi constatado que o corpo era mesmo de Araceli.
Quem encontrou o corpo de Araceli foi o policial Ronaldo Monjardim, junto com o seu pai.
Testemunhas e contradições
Durante as investigações, provas e depoimentos misturaram fatos com boatos. Diante dos fatos apresentados pela denúncia do promotor Wolmar Bermudes, a Justiça chegou a três principais suspeitos:
- Dante de Barros Michelini (o Dantinho)
- Dante de Brito Michelini (pai de Dantinho)
- Paulo Constanteen Helal
Todos os suspeitos são membros de tradicionais e influentes famílias do Espírito Santo.
Versão dos acusados
Depois do julgamento, os envolvidos se recusaram a falar sobre o assunto com a imprensa diversas vezes e não foram localizados pela reportagem.
Versão da acusação
A versão da morte da menina apresentada pela acusação, que mais tarde terminou no julgamento dos acusados, afirma que Araceli foi raptada por Paulo Helal, no bar que ficava entre os cruzamentos da Rua Ferreira Coelho e a Avenida César Hilal, após sair do colégio.
No mesmo dia, a menina teria sido levada para o então Bar Franciscano, na Praia de Camburi, que pertencia à Dante Michelini, onde foi estuprada e mantida em cárcere privado sob efeito de drogas.
Por causa do excesso de drogas, Araceli entrou em coma e foi levada para o hospital, onde já chegou morta. Segundo essa versão, Paulo Helal e Dantinho jogaram o corpo da menina em uma mata, atrás do Hospital Infantil, em Vitória.
Em entrevista ao Globo Repórter de 1977, o promotor Wolmar Bermudes explicou a quem se destinavam as acusações.
“O Dante Michelini pai pesa a acusação de haver mantido a menor em cárcere privado, dois dias, no sótão do seu bar, em Camburi. Contra os dois, o Dante Filho e o Helal, pesam as acusações de haver os dois ministrado à infeliz menor tóxicos e haver, ainda, de maneira violenta, mantido congresso carnal com a infeliz menina”, disse na entrevista.
Ainda segundo a denúncia, Dante Michelini usou suas ligações e influência com a polícia capixaba para dificultar o trabalho da polícia. Além disso, testemunhas-chave do processo morreram durante as investigações. Nenhuma dessas acusações foi provada.
Durante o julgamento, Paulo Helal e Dantinho negaram conhecer Araceli ou qualquer outro membro da família Cabrera Crespo.
6- Julgamento
Em 1980, o juiz responsável pelo caso, Hilton Silly, definiu a sentença: Paulo Helal e Dantinho deveriam cumprir 18 anos de reclusão e o pagamento de uma multa de 18 mil cruzeiros. Dante Michelini foi condenado a 5 anos de reclusão.
Na ocasião, o juiz Hilton Silly disse em entrevista ao Jornal da Globo que os três foram condenados, porque foi provada a materialidade e a autoria do crime.
“Foi através não só da farta prova testemunhal, mas também, sobretudo, da prova indiciária, que é chamada prova artificial indireta por circustancial, baseado em indícios veementes, graves, sérios e em perfeita sintonia de causa e efeito com o fato principal”, afirmou em 1980.
Em 1991, os acusados recorreram da decisão e o caso voltou a ser investigado. O Tribunal de Justiça do Espírito Santo anulou a sentença, e o processo passou para o juiz Paulo Copolilo, que gastou cinco anos para estudar o processo.
Por fim, ele escreveu uma sentença de mais de 700 páginas que absolvia os acusados por falta de provas.
Em 1993, o caso prescreveu sem que ninguém fosse punido.
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