É impressionante como o tempo passa mais rápido do que a nossa capacidade de percebê-lo, entretanto, para quem trabalha na rede de ensino, convivendo com diversas crianças e as vendo crescer, se torna um verdadeiro laboratório de gerações, acontecendo diante de nossos olhos. A infância é aquela fase marcada por brincadeiras que tentam emular situações fantasiosas (super-heróis e fadas), mas também situações futuras, como quando as crianças brincam de ser professores, médicos, vendedores etc.
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Na infância das décadas de 90 e 2000 era muito comum ver crianças brincando de polícia e ladrão, uma brincadeira extremamente popular, principalmente para crianças que não tinham brinquedos mais sofisticados (às vezes brinquedo algum), bastava um galho de árvore que parecesse levemente com um revólver, a camiseta amarrada “estilo ninja” no rosto, definia-se quem seriam os ladrões e os policiais e a brincadeira começava. A brincadeira em si, obviamente, não leva as crianças a se tornarem criminosas no futuro. No entanto, é fundamental lembrar que as brincadeiras podem revelar a forma como as crianças percebem o mundo ao seu redor. Brincar de polícia e ladrão pode normalizar a ideia de que a aplicação da lei envolve perseguir e prender “ladrões”, o que, em alguns casos, pode simplificar demais questões complexas de justiça e segurança pública.
Para aquelas pessoas que leem o título do artigo e já começam a tecer seus argumentos em forma de comentário, possivelmente, diversas interpretações sobre o que este texto trata, já começaram a ser emitidas, mas quero deixar claro que, não acho correto (nem quero) condenar quaisquer tipos de brincadeiras ou atividades da infância, tão pouco ditar regra sobre criação de filho. A ideia principal aqui é convidar as pessoas a pensarem sobre as implicações da construção de uma cultura. Imagine comigo: Em que tipo de sociedade vive uma criança que escolhe dentre as suas brincadeiras, simular um ser criminoso? Não pretendo responder essa pergunta mas, faço uma afirmação: O que nós somos e fazemos, costuma ser o reflexo da realidade a qual vivemos.
Normalmente em comunidades e localidades onde existe alta incidência de crimes e violência, até as brincadeiras que as crianças preferem refletem a realidade diante de seus olhos. Lembro-me do clipe do célebre rap: “Diário de um detento” dos Racionais Mc’s, onde narra a visão de um presidiário de como é a vida em uma casa de detenção, mas também como é a realidade em que ele vive, sua comunidade e os desafios que enfrenta. Ao fim do clipe, um grupo de crianças correndo, brincando de polícia e ladrão, com armas feitas de madeira.
Não quero dizer com isso que as crianças da Islândia, ou Dinamarca não venham a brincar em algum momento de polícia e ladrão, estando me referindo a dois países com as menores taxas de homicídios e crimes de modo geral, também não estou dizendo que crianças que brincam de serem ladrões se tornarão ladrões, mas, aproveitando a oportunidade (que vão dizer se tratar apenas de mimimi desarmamentista mesmo), acredito que seja uma boa discussão falar sobre como podemos ensinar as crianças, caminhos mais promissores para se construir um futuro.